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Foto do escritorCarlos Dias

Equívoco: Moody's subestima riscos fiscais brasileiros


A recente elevação da nota de crédito do Brasil pela Moody's, de Ba2 para Ba1, com perspectiva positiva e que coloca o país próximo ao grau de investimento, suscita sérios questionamentos quanto à sua fundamentação técnica e possíveis motivações políticas.


Comparando o cenário atual com agosto de 2006, última vez em que a Moody's concedeu upgrade similar, observam-se discrepâncias graves. Em 2006, o Brasil apresentava uma dívida bruta de 58,5% do PIB, com um superávit primário de 3,4% do PIB. Hoje, a situação é drasticamente diferente: a dívida bruta alcança 78,5% do PIB, com um déficit primário de 2,3% do PIB.


A deterioração fiscal é evidente e preocupante. Em 2006, o Brasil alcançava o superávit primário necessário para estabilizar a dívida (3,4% do PIB), enquanto hoje apresenta um déficit primário de 5,7% do PIB em relação ao superávit requerido para a sustentabilidade fiscal. Esta disparidade revela uma trajetória insustentável da dívida, contradizendo frontalmente a avaliação otimista da Moody's.


A justificativa da agência, citando "melhoras materiais no perfil de crédito" e um "crescente track record de reformas", parece desconsiderar a realidade dos números. A menção à reforma tributária ainda não aprovada e ao arcabouço fiscal frequentemente desafiado sugere uma avaliação baseada mais em expectativas do que em resultados concretos.


A projeção de estabilização da dívida bruta ignora sua trajetória ascendente e o déficit primário persistente. A perspectiva positiva, baseada no cumprimento do arcabouço fiscal, assemelha-se mais a um otimismo infundado do que a uma análise técnica rigorosa.


É particularmente questionável a afirmação sobre o crescimento econômico ser "suportado por maiores investimentos", quando dados recentes mostram uma retração de 0,9% nos investimentos. Além disso, a atribuição de reformas a sucessivos governos é factualmente incorreta, pois reformas como a independência do Banco Central e a trabalhista foram implementadas especificamente durante os governos Temer e Bolsonaro.


A decisão da Moody's parece desalinhada com a realidade econômica brasileira e potencialmente influenciada por fatores além dos fundamentos técnicos. Esta abordagem compromete a integridade do processo de avaliação de crédito e pode induzir a erros de percepção nos mercados financeiros globais sobre a real situação econômica do Brasil.


A elevação da nota de crédito do Brasil pela Moody's, neste momento, parece prematura e potencialmente equivocada. A discrepância entre os fundamentos econômicos atuais e a avaliação positiva da agência demanda uma revisão crítica não apenas desta decisão específica, mas também dos métodos e critérios utilizados pelas agências de rating em suas avaliações de economias emergentes.


Esta situação reforça a necessidade de uma abordagem mais transparente e tecnicamente fundamentada na avaliação de riscos soberanos, especialmente em um cenário global de crescente complexidade econômica, política e geopolítica. É imperativo que as avaliações de crédito reflitam com precisão a realidade econômica dos países, evitando distorções que possam levar a decisões equivocadas de investimento e política econômica.

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