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A Economia Americana e a Narrativa de Mercado


Ciclos econômicos são inevitáveis. Joseph Schumpter consagraria este fato com sua teoria da destruição criativa. Mais que inevitáveis, o desacelerar de uma economia remove empresas velhas e ineficientes e dá espaço a novos empreendedores, mais modernos e arrojados. O grande trunfo da economia de mercado estaria justamente no fato que mais inflama seus críticos.


Esta é uma lição que os economistas precisaram reaprender frequentemente ao longo do tempo. Na década de 70, os avanços da econometria permitiram a criação de modelos cada vez mais sofisticados, levando os economistas a se identificarem como engenheiros da complicada máquina social. O fracasso dessa corrente no campo acadêmico viria com a chamada “Crítica de Lucas”. Na qual seu criador, Robert Lucas, afirmava que existia uma variável que não era considerada, por falta de boas métricas, nos modelos: a reação das pessoas ao seu ambiente.


Na vida real, o fracasso da “engenharia econômica” veio com o descontrole inflacionário nos Estados Unidos durante a década de 80. A famosa Curva de Phillips afirmava ser possível trocar apenas um pouco mais de inflação por um desemprego permanentemente mais baixo, mas isso não aconteceu no caso americano.


Como foi possível a inflação continuar acelerando se os modelos afirmam que ela deveria cair? A curva de Phillips tradicional não contava com a reação das pessoas. Quando defrontados com uma inflação persistentemente mais alta, as pessoas passaram a esperar uma inflação ainda maior no futuro. E foi essa expectativa que os modelos não previram.


No pós-pandemia, após uma década de juros próximos a zero e inflação persistente abaixo da meta do Fed, novamente, os modelos (desta vez ainda mais sofisticados) não foram capazes de prever a mais alta inflação desde a década de 80 que estava por vir. Como afirmou, o ex-Secretário do Tesouro Americano, Larry Summers, em 2021, os sucessivos erros de projeção de inflação do Fed colocaram o Banco em uma situação difícil, uma vez que ele perdeu sua preciosa credibilidade: “O Fed fracassou conosco”, dissera Summers.


Para sanar o problema, o atual presidente do Fed, Jerome Powell, jogou os modelos pela janela e conduziu um agressivo corte de juros que lhe rendeu comparações a Paul Volcker, que presidiu o Fed de 1979 a 1987 e foi o responsável por controlar a inflação causada pela “engenharia econômica”.


Dois anos depois, deparamo-nos mais uma vez com tal dilema. A economia americana começa a mostrar sinais de desaceleração. Dados divulgados na última sexta-feira, mostram que taxa de desemprego acelerou, em alguns meses, de 3.6% para 4.3%.



Enquanto o Fed se prepara para iniciar gradualmente um ciclo de corte de juros, os participantes do mercado clamam por uma ação enérgica: os cortes deveriam ser de 0.50%, ao invés do tradicional 0.25%. Economistas relevantes, como Bill Dudley, ex-presidente do Fed de Nova York, afirmam que já é tarde demais para salvar a economia.


O principal argumento de Dudley é a Regra de Sahm, criada pela ex-economista do Fed, Claudia Sahm. A regra determina que uma vez que a taxa de desemprego alcança uma determinada aceleração, tradicionalmente, uma recessão está na iminência de ocorrer.



Entretanto, a própria Sahm afirmou que é necessário um certo ceticismo com a regra desta vez. Vivemos um ciclo suis generis em termos econômicos. Nunca tivemos 25% do PIB americano sendo diretamente depositado nas contas bancárias das pessoas; nem um pacote de subsídios à construção de fábricas de alta tecnologia do governo americano. Muito menos - e este é ponto importante para a Regra de Sahm -, uma imigração em massa nos Estados Unidos, com a estimativa chegando a 2 milhões de imigrantes.


Um choque tão grande na força de trabalho, com trabalhadores pouco qualificados em empregos precários, tende a superestimar o aumento do desemprego no começo da desaceleração econômica. A economia americana está desacelerando, mas os dados do PIB mostram que está longe do colapso como os agentes de mercado têm dado a entender.


A reação do mercado (precificando cortes agressivos de juros e queda na bolsa) sugere a antecipação da chamada “Fed Put” - que o Fed será rápido a reagir a qualquer desaceleração econômica e que se preocupa com a queda na bolsa, uma vez que grande parte das aposentadorias está alocada lá. A “Fed Put” é a reencarnação da “engenharia econômica”. A crença de que é o banco central é capaz de fazer ajustes finos na economia de modo a suavizar qualquer tipo de ciclo.


Depois de uma luta severa contra a inflação, o Fed deveria adotar uma postura mais cautelosa, mesmo frente a dados econômicos mais fracos. Neste momento de ânimos exaltados, cabe aos formuladores de política virem a público afirmar categoricamente que não há motivo para pânico e que o Fed será conservador porém vigilante. Para isso, entretanto, é preciso que eles se lembrem que Economia está longe de ser Engenharia.


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